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sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Interação com empresas estimula produção científica em universidades



Wilson Suzigan, da Unicamp, comenta primeiros resultados do Projeto Temático que coordena sobre interação entre universidades e empresas no Brasil (Jornal da Unicamp)
17/11/2011

Por Fábio de Castro

Agência FAPESP – Diversos grupos de pesquisadores têm estudado a fundo, de forma articulada e em diversos países, a situação atual, as perspectivas futuras e os desafios das interações entre universidades e empresas.

A vertente brasileira desses grupos se organizou, nos últimos quatro anos, em torno do Projeto Temático “Interações de universidades e instituições de pesquisa com empresas industriais no Brasil”, financiado pela FAPESP e coordenado por Wilson Suzigan, professor do Instituto de Geociências e chefe do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Lançado na última semana de outubro, o livro Em Busca da Inovação: Interação Universidade-Empresa no Brasil é o primeiro produto do Temático. A obra é organizada por Suzigan, Eduardo da Motta e Albuquerque e Silvio Antonio Ferraz Cário, respectivamente professores dos departamentos de Ciências Econômicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

De acordo com Suzigan, o livro é uma “fotografia das colaborações entre universidades e empresas no sistema científico brasileiro”. Ao detalhar a natureza, extensão e distribuição regional das interações, os autores procuraram fazer uma avaliação do atual estágio de construção do sistema brasileiro de inovação.

A interação foi observada pela perspectiva do setor científico: a análise se baseou em questionários apresentados a representantes dos grupos de pesquisa relacionados no diretório do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

“O questionário foi apresentado aos grupos de pesquisa que declararam ter parcerias com empresas. A partir daí, procuramos identificar quais interações com a academia são mais relevantes para o setor produtivo”, disse à Agência FAPESP.

Os resultados mostrados no livro permitem esclarecer uma polêmica. Segundo Suzigan, muitos ainda se posicionam contra a interação entre academia e empresas por enxergar esse envolvimento como um desvio das funções da universidade, que deveria se dedicar apenas à pesquisa pura.

“Mostramos que é o contrário: a grande maioria dos grupos de pesquisa interativos melhora seu desempenho científico, com mais teses, mais dissertações, mais projetos de iniciação científica e muito mais publicações. A interação gera benefícios para o grupo de pesquisa, assim como para o setor produtivo”, afirmou.

Na entrevista a seguir, Suzigan detalha como foi organizado o Projeto Temático cujos estudos serviram de fundamento para o livro. Suzigan foi um dos coordenadores-executivos dos Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação em São Paulo 2010, publicação da FAPESP.

Agência FAPESP – O Projeto Temático faz parte de uma cooperação internacional?
Wilson Suzigan – O projeto surgiu a partir do relacionamento internacional de alguns pesquisadores do nosso grupo com equipes internacionais congêneres, cuja articulação foi estimulada pelo professor Richard Nelson, da Universidade de Columbia, Estados Unidos, um dos principais especialistas no mundo em estudos relacionados a catching up tecnológico [equiparação com setores ou países líderes], sistemas de inovação e interação entre universidades e empresas. Esses grupos acabaram se organizando internacionalmente sob o nome de Catch-Up Project. Um ramo passou a trabalhar com estudos setoriais e outro ramo com interação entre universidades e empresas. O grupo brasileiro, que seguiu essa última vertente, foi liderado pelo professor Albuquerque, da UFMG, que me convidou para coordenar as pesquisas no Brasil no fim de 2006. No fim de 2007, a FAPESP aprovou o Temático.

Agência FAPESP – Os estudos seguiram a mesma metodologia nos vários países?
Suzigan – Na medida do possível, sim. Estabelecemos um subgrupo composto por 12 países – Brasil, Argentina, México, Costa Rica, África do Sul, Nigéria e mais seis países asiáticos – e fizemos uma discussão prévia para conceber o questionário para uma pesquisa de campo. A ideia era replicar nos 12 países a experiência que havia sido feita nos Estados Unidos para estudar o tema da interação entre universidades e empresas. As universidades de Carnegie Melon e Yale haviam feito duas pesquisas com aplicação de questionários. A primeira foi feita em meados da década de 1980 e publicada na década de 1990. A segunda foi feita na década de 1990 e publicada em 2002.

Agência FAPESP – Quando foram feitos os questionários do Brasil?
Suzigan – Em 2008 e 2009. Nos outros 12 países foram realizados mais ou menos na mesma época. A ideia era aplicar uma metodologia quantitativa que permitisse verificar com dados concretos qual a característica básica da interação das universidades e dos institutos de pesquisa com empresas, tendo em vista conceber novos produtos, gerar inovação de modo geral, concluir projetos ou realizar consultoria, por exemplo.

Agência FAPESP – Os dados permitiram chegar a alguma conclusão específica, ou a uma síntese com os resultados mais gerais do projeto?
Suzigan – O objetivo era chegar a uma matriz de relações entre áreas de conhecimento científico e setores de atividade produtiva. Podemos dizer que o resultado síntese do projeto foi uma matriz que aponta as células de interesse entre áreas específicas do conhecimento e os setores de atividade econômica cuja interação nós caracterizamos.

Agência FAPESP – Poderia citar exemplos dessas áreas?
Suzigan – A lista é grande, mas a título de exemplo podemos mencionar um campo do conhecimento que reúne as áreas de engenharia de materiais, engenharia de minas e engenharia metalúrgica. Se observarmos a matriz que resultou do Projeto Temático, veremos que esse campo de conhecimento científico tem uma intersecção muito grande com setores de atividade que são tipicamente usuários desse tipo de conhecimento: produtos metalúrgicos básicos, metalurgia e produção de minerais. Nosso produto síntese é uma grande tabela que mostra todas as intersecções de áreas específicas do conhecimento e setores de atividade econômica. A partir de agora, passaremos a explorar as minúcias dessa matriz.

Agência FAPESP – O projeto, então, gerou dados que serão explorados em diversas outras pesquisas daqui em diante?
Suzigan – Sim. É importante destacar também que o Temático agregou uma inovação significativa em relação aos estudos realizados nos 12 países, incluindo o Brasil: só aqui tivemos a possibilidade de fazer, no universo acadêmico, o mesmo tipo de avaliação quantitativa que todos os países fizeram para as empresas. Pudemos aplicar os questionários aos pesquisadores acadêmicos porque no Brasil temos uma fonte riquíssima de informações que é o diretório de grupos de pesquisa do CNPq. Assim, por um lado pudemos traçar um panorama das capacitações científicas brasileiras, a partir de grupos de pesquisa que se declaravam interativos com o setor produtivo. Por outro lado, derivamos também, a partir do diretório, uma amostra de empresas que são interativas. Conseguimos juntar as duas coisas: um mapa das capacitações científicas dos pesquisadores ligados com empresas e uma avaliação dos setores mais interativos, a partir do questionário aplicado às empresas.

Agência FAPESP – Os dados gerados por esse levantamento poderão ser utilizados no futuro para traçar políticas públicas de inovação?
Suzigan – Sem dúvida. Do meu ponto de vista o levantamento é extremamente relevante para a formação de políticas de inovação. Temos a oportunidade, a partir desses resultados, de verificar concretamente coisas que talvez pudéssemos intuir, mas para as quais não havia comprovação científica.

Agência FAPESP – Poderia citar um exemplo dessas impressões que não podiam ser comprovadas sem dados?
Suzigan – Temos, por exemplo, uma discussão tão controversa como relevante sobre a política de estímulo ao catching up tecnológico. Muita gente acha que essa política deveria ter foco nas indústrias de tecnologia avançada. A pesquisa demonstra que os setores de baixa e média tecnologia são também importantes usuários dos conhecimentos gerados pela universidade. Uma vez que verificamos isso, fica evidente que não devemos fazer políticas públicas voltadas exclusivamente para altas tecnologias.

Agência FAPESP – Por que é importante identificar os setores onde há mais interação entre universidade e empresa?
Suzigan – Ao detectar os setores onde há mais interação podemos examinar porque eles têm essa vantagem comparativa e, a partir daí, tentar reproduzir as condições em outros setores onde há pouca interação. O Brasil tem uma posição muito relevante de produção científica nas áreas de saúde, por exemplo. Mas se olharmos a matriz que foi produzida pelo Projeto Temático veremos que na indústria farmacêutica não há destaque algum. Isto é: não aparece na tabela nenhuma intersecção que represente uma interação entre a indústria farmacêutica e a medicina, ou a veterinária. Isso deveria nos fazer pensar. Por outro lado, temos outros exemplos que são extraordinariamente ilustrativos no sentido oposto.

Agência FAPESP – Quais são esses exemplos?
Suzigan – Temos certa relevância em ciências agrárias e agronomia e essa relevância serve como um elemento estratégico fundamental para o que se observa hoje na agroindústria brasileira. Temos setores considerados de baixa tecnologia – como commodities agrícolas, derivados da soja, carne e produtos animais – que, no entanto, contam com um grande conhecimento científico embutido. Embora não haja alta tecnologia na soja, o componente de conhecimento científico agregado nesse produto é o fator que garantiu sua competitividade.

Agência FAPESP – Em relação aos outros países emergentes, qual é a posição do Brasil na interação entre universidade e empresa?
Suzigan– Nossa posição não chega a destoar muito. Os pontos de interação – como chamamos os cruzamentos entre setores de atividade e áreas do desenvolvimento tecnológico e científico verificados na nossa matriz – encontrados pela pesquisa norte-americana publicada em 2002 são 47. No Brasil, temos 34 pontos de cruzamento. Temos que considerar, nessa comparação, as diferenças de PIB e o fato de que na pesquisa norte-americana foram consultadas 1.200 empresas e no Brasil foram consultadas 325. Na Argentina, onde a matriz industrial tem menos diversidade, foram encontrados 19 casos relevantes de pontos de interação. No México foram encontrados 42, refletindo provavelmente o benefício trazido pela interação econômica com os Estados Unidos.

Fonte:http://agencia.fapesp.br/14785

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