Artigo de Isaac Roitman publicado no Correio Braziliense de hoje (14).
Tive o privilégio de visitar recentemente a Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), no complexo de Itaipu, em Foz de Iguaçu, região trinacional: Argentina, Brasil e Paraguai. Ela é uma das caçulas no sistema federal de universidades e sua implantação foi precedida pela criação, em maio 2007, do Instituto Mercosul de Estudos Avançados (Imea), uma parceria da Hidrelétrica de Itaipu, da Universidade Federal do Paraná e da Universidade de Pisa. Em dezembro do mesmo ano, o Ministério da Educação enviou à Presidência da República o projeto de criação da Unila.
Em janeiro de 2008 foi criada a comissão de implantação, com a participação de 13 membros e presidida pelo atual reitor, professor Hélgio Trindade. O desafio da comissão foi construir o modelo de uma universidade para o século 21, criando uma instituição que respondesse de forma inovadora e competente à integração promovida pela convivência intelectual e interpessoal, estabelecendo acordos de cooperação e intercâmbio, e aberta a toda América Latina e ao Caribe.
Esse desafio implicava em romper os parâmetros tradicionais e absorver, de forma crítica, a experiência de sucesso de outras universidades latino-americanas. Resgatando a ideia de Darcy Ribeiro, de consulta a cientistas, professores e intelectuais brasileiros, na elaboração da proposta de criação da Universidade de Brasília, foi feita ampla consulta, agora de âmbito internacional. Além de brasileiros, foram consultados especialistas de vários países: México, Nicarágua, Venezuela, Argentina, Estados Unidos, Uruguai, Chile, Colômbia, França, Portugal e Espanha.
Às indagações, procuraram respostas na missão da nova universidade no contexto da mundialização, seus principais eixos temáticos, da inter e da transdisciplinaridade, das formas de recrutamento de alunos e professores e na harmonização do local, do regional e do universal, voltada para os desafios da América Latina. As contribuições foram compiladas no livro: Unila - Consulta internacional (Imea 2/2009).
É importante destacar algumas sugestões e comentários, como o de Celso Pinto Melo, atual presidente da Sociedade Brasileira de Física: "Usar extensivamente um programa de professores visitantes, que pudessem passar períodos não muito longos debatendo novas ideias e novas abordagens para as questões da América Latina". É também precioso o comentário do neurocientista Ivan Izquierdo: "A Unila deverá entender como princípio fundamental que o conhecimento sempre foi global - o que Sócrates, Galileu, Newton, Einstein, Jenner, Shakespeare, Borges e Beethoven criaram, pensaram e inventaram foi para todos, pertence ao mundo todo". Outra sugestão que merece destaque foi feita pelo físico Sérgio Mascarenhas: "Criando um território diplomático tipo "zona franca do conhecimento" para os atores da obra Unila, de modo tal que as partes se libertem de culturas congeladas em regras jurídicas, isonomias funcionais, aversão ao risco das diferenças de mérito e outras facetas da cultura herdada pelo Brasil".
O projeto de lei da criação da Unila foi sancionado em janeiro de 2010 e as atividades acadêmica foram iniciadas em agosto do mesmo ano, nos seguintes cursos de graduação: ciências biológicas - ecologia e biodiversidade; ciências econômicas - economia, integração e desenvolvimento; ciência política e sociologia - sociedade, Estado e política na América Latina; engenharia de energias renováveis, engenharia civil de infraestrutura; relações internacionais e integração. Posteriormente foram criados novos cursos nas áreas de antropologia, desenvolvimento agrário e segurança alimentar, geografia, história e letras. A meta em cinco anos é chegar a 10 mil alunos, 5 mil do Brasil e 5 mil de outros países da América Latina.
Da visita mencionada no início do artigo, fiquei particularmente impressionado com o entusiasmo e a paixão dos dirigentes e professores. Presenciei casualmente, com professores e alunos de diferentes áreas de conhecimento, uma experiência de física instrumentalizada por raio laser em um espaço de convivência onde se podia ver o céu, as árvores e ouvir o canto dos pássaros. Nesse ambiente universitário permeado pelo bilinguismo, pela interdisciplinaridade e pela multiculturalidade, conversei com estudantes brasileiros e de outros países que estampavam em seus rostos sorridentes a satisfação e o privilégio de estarem em uma instituição inovadora, voltada para quebrar o modelo envelhecido das universidades brasileiras e latino-americanas. Vida longa para a Unila.
Issac Roitman é professor aposentado da Universidade de Brasília, membro titular da Academia Brasileira de Ciências e coordenador do Grupo de Trabalho de Educação da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência.
Fonte:http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=79692
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