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terça-feira, 10 de agosto de 2010

Avatares vão sair do cinema para a vida real

Notícias Terça-Feira, 10 de agosto de 2010
JC e-mail 4070, de 09 de Agosto de 2010.



Neurocientista desenvolve formas inéditas de conectar o cérebro a máquinas e ajudar pessoas com paralisia

Um dos maiores expoentes dos pioneiros estudos sobre a interação entre cérebro e máquinas, o neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, do Centro Médico da Universidade de Duke, nos EUA, acaba de conquistar um prêmio inédito do governo americano.



São US$ 2,5 milhões em financiamento de pesquisa ao longo dos próximos cinco anos, que garantirão os recursos necessários para que o cientista dê continuidade a seus trabalhos.



Nos próximos cinco a dez anos, as aplicações imediatas seriam para o mal de Parkinson e algumas paralisias localizadas.



A médio prazo, ele planeja a criação de armaduras virtuais, comandadas pelo cérebro, verdadeiros avatares capazes de devolver movimentos a pessoas paralisadas. A longo prazo, o neurocientista vislumbra um mundo em que toda a comunicação será feita pela mente. Nicolelis integra a lista de 81 contemplados com o Pioneer Award, do Instituto Nacional de Saúde dos EUA, e é o primeiro brasileiro a receber o prêmio.



Leia entrevista:



Prevendo o futuro



"Esse prêmio nos permite dar um salto quântico e ampliar consideravelmente escopo das nossas pesquisas, tanto do ponto de vista tecnológico quanto das perguntas que poderemos fazer, graças à liberdade de ação que ganhamos. Pela própria característica do prêmio é algo com inovação muito grande. A ideia é justamente prever o futuro para os próximos cinco anos em cada área."



Estudos atuais



"Desenvolvemos tecnologia para registrar a atividade elétrica das células do cérebro e criar um ambiente virtual para testar os limites do que é possível fazer tanto no campo da reabilitação neurológica, que inclui mal de Parkinson e doenças degenerativas, quanto para criar um novo paradigma para que toda sorte de novas tecnologias que usam o cérebro como sinal de comando para futuras interações entre homem e máquina possam ser testadas e desenvolvidas. Uma das coisas é criar uma pequena versão de simulador virtual para testar limites desse paradigma, dessa interface cérebro-máquina, e princípios de funcionamento de grandes redes neurais."



O grande simulador



"Queremos entender como o cérebro processa informação, como a obtém, como gera modelos de realidade, do nosso sentido de ser, do nosso corpo, da nossa interpretação do mundo. Queremos ir fundo nos princípios computacionais e fisiológicos que permitem que o cérebro seja um grande simulador da realidade."



Outras aplicações



"As aplicações vão muito além da medicina. Esse entendimento abre novos caminhos, por exemplo, para a arquitetura computacional, novas interfaces para a ampliação da capacidade de ação humana. Podemos pensar em estarmos sentados em um lugar e usar nossa atividade cerebral para controlar um robô ou um artefato qualquer em outro lugar ou mesmo em outro planeta. Essa tecnologia amplia a capacidade de alcance do ser humano."



Avatares



"Em cinco anos possivelmente já poderemos testar o controle, por meio da atividade do cérebro, de um corpo virtual, uma réplica de uma veste robótica para pacientes com paralisia. Vamos usar a atividade elétrica cerebral para termos um corpo virtual, um avatar. Vamos testar inicialmente em primatas e, depois, em humanos. Um paciente com lesão medular poderia usar sua atividade elétrica para controlar a veste."



Células-tronco embrionárias



"Estamos falando de pacientes tetraplégicos há muitos anos, onde células-tronco não teriam efeito. Elas seriam mais indicadas para lesões recentes, como as que serão testadas. Nossa solução serve também para pacientes crônicos. Acho que, no futuro, elas vão se complementar e poderão ser usadas de forma combinadas: células-tronco e veste robótica. É o efeito sinérgico de duas novas tecnologias."



Primeiras aplicações



"Estamos testando, neste momento, a aplicação da nova tecnologia para Parkinson em primatas. Os resultados iniciais são muito bons, encorajadores. O uso em paralisia está sendo desenvolvido por vários grupos, com abordagens diferentes. Acho que teremos muitas surpresas em cinco ou dez anos. Estamos terminando também um projeto em que demonstramos a possibilidade de mandar sinais do artefato de volta para o cérebro (não apenas do cérebro para a máquina). Para isso, estamos criando um código novo de comunicação para publicação nos próximos dias."



A resposta da máquina



"Cada vez que a mão robótica encontra um objeto, ela envia uma mensagem elétrica para cérebro. O cérebro aprende, como uma criança, a associar as mensagens aos tipos de objetos encontrados. É fundamental termos esse retorno sensorial, poder sentir como a ferramenta robótica interage com o mundo, porque é assim que se cria e testa novos modelos de realidade. É importante criar esse feedback tátil, sensorial, para aprimorar o controle dos movimentos, mas também para poder sentir o que se está fazendo ao explorar o ambiente remoto. Trata-se de um novo artefato, uma interface cérebro-máquina-cérebro. O estudo também foi submetido para publicação e acredito que terá um impacto grande."



Do maracanã a marte



"Essa é uma imagem que gosto de usar: você está sentado aí no Rio, assistindo a um jogo no Maracanã, e controlando um robô que passeia pelas dunas de Marte, não só controlando o seu movimento, mas experimentando o que ele experimenta."



A nova era do culto ao cérebro



"No ano que vem lanço um livro com todas as potenciais aplicações da tecnologia no dia a dia. São muitas, como comunicação entre pessoas, interação com computadores. Será um mundo novo, centrado no cérebro. O culto ao corpo finalmente chega ao fim, vamos viver a fase do culto ao cérebro, em que o corpo será apenas um invólucro para manter o cérebro funcionando."

(Roberta Jansen)

(O Globo, 8/8)

Fonte:http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=72695

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