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quinta-feira, 3 de março de 2011

A próxima Pandemia



Informe divulgado ontem (1) na China deixou autoridades sanitárias em alerta em todo o mundo: o vírus da gripe suína H1N1 é compatível com o da gripe aviária endêmica.

A combinação dele com o H9N2 pode resultar em espécimes mais virulentos. O grande temor, atualmente, dos infectologistas de todo o planeta é justamente esse, a mistura genética de vírus influenza levando a híbridos novos e mais letais, como revela Stefan Cunha Ujvari, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, de São Paulo, no recém-lançado livro Pandemias - a Humanidade em risco (Ed. Contexto).

Nesta entrevista, o especialista conta que a maior ameaça hoje ao planeta é o vírus da gripe aviária H2N1, com uma assustadora mortalidade de 50%.

Ujvari destaca ainda o surgimento cada vez mais comuns de vírus raros, como o ebola; nas chances de o chicungunya, da Ásia, chegar ao Brasil; e nos riscos do surgimento de "uma nova Aids". "Vivemos um momento interessante da História, alterando cada vez mais o meio ambiente, desmatando, criando mais animais para alimentação. Além disso, temos um aumento populacional e um tráfego global muito grande. Essas condições favorecem o surgimento de novos vírus."

O Globo: Por que um livro sobre pandemias? A Humanidade está em perigo?

Stefan Cunha Ujvari: Estamos vivendo um momento interessante da História, alterando cada vez mais o meio ambiente, desmatando, criando mais animais para alimentação. Além disso, temos um aumento populacional e um tráfego global muito grande, muita gente cruzando fronteiras. Essas condições favorecem o surgimento de novos vírus.

De que forma?

Ujvari: A gripe suína, por exemplo, foi uma combinação de quatro vírus
diferentes. O novo vírus foi formado pela combinação de um vírus do homem, um vírus do porco americano, outro do porco europeu e um de ave. Quanto mais vírus forem
transmitidos de um para o outro, mais misturas podem ocorrer.

Hoje, quem é o principal candidato a causar uma pandemia mundial grave?

Ujvari: O H5N1 (da gripe aviária). Ele é o grande temor. É um vírus frequênte nas aves migratórias, eclode nas criações de aves com periodicidade e, todos os anos, há registros de casos de homens que entram em contato com aves e ficam doentes. A maior cobertura da mídia foi em 2003, mas isso continua até hoje. Todo ano tem alguns casos.
Mas é um vírus que se transmite entre aves e, eventualmente, de aves para humanos. O grande risco é ele sofrer uma mutação que o torne transmissível de pessoa a pessoa ou
se misturar geneticamente a algum outro vírus que passe de homem a homem. Ele seria o candidato número um para causar uma pandemia com letalidade considerável.

Qual seria essa letalidade?

Ujvari: Hoje, quando se instala no homem, essa gripe causa um estrago pulmonar muito grande. Sua letalidade é de 50%. Mas, se tiver a capacidade de passar entre homens, tende a ter sua mortalidade reduzida. Mas não sabemos, uma vez que será um vírus novo.

No caso da gripe suína, de 2009, houve muitas críticas à OMS. Muitos disseram que a organização se precipitou ao declarar uma pandemia. Qual a sua opinião?

Ujvari: Sempre se espera um influenza novo, que pode causar uma grande letalidade. Então, temos que tomar cuidado diante de qualquer vírus novo. As medidas não foram exageradas. A gripe suína não causou uma mortalidade tão grande, mas provocou uma letalidade que, até hoje, não conseguimos entender muito bem, em pessoas jovens e saudáveis.

As superbactérias são cada vez mais comuns em hospitais e o número de lançamentos de antibióticos é cada vez menor. Por quê?

Ujvari: O que vemos hoje é um lançamento maciço de drogas para doenças crônicas, como colesterol alto, hipertensão, diabetes, assim por diante. Alguns trabalhos nos EUA mostram que o número de novos antibióticos lançados no mercado vem diminuindo. Isso ocorre porque eles não geram o lucro esperado. Na comunidade não há tantas bactérias resistentes assim, seriam remédios usados apenas em hospitais. Ou seja, o retorno financeiro seria baixo.

E qual o risco que corremos com as superbactérias? Pode haver uma epidemia de bactérias resistentes?

Ujari: Na comunidade em geral, não; mas em hospitais sim. Há várias bactérias se tornando resistentes e temos um número cada vez mais restrito de opções de antibióticos. Para algumas delas, só há um remédio, e a tendência é ir piorando. Estamos na iminência do surgimento de bactérias para as quais não há nenhum antibiótico no mercado.

O vírus chickungunya tem sintomas similares aos da dengue e é transmitido pelo Aedes. Qual o risco de sua chegada ao Brasil?

Ujvari: A dengue tem uma letalidade mais alta, mas o chicungunya incapacita por mais tempo, causa dor nas juntas. Mas os sintomas são bem parecidos. A confusão de diagnóstico seria ruim para identificar a chegada do vírus, o início da epidemia. Além disso, passaríamos a ter dois problemas a cada início de ano.

Os vírus mais ameaçadores são aqueles que provocam febres hemorrágicas com altíssima letalidade, como ebola, marburg e lassa. Existe algum risco de termos uma epidemia dessas?

Ujvari: Com o turismo cada vez mais intenso, principalmente para a África, a chance de pessoas se infectarem existe. E pode haver demora no diagnóstico e outras pessoas contaminadas até perceberem que se trata de um vírus novo. Há pouco tempo, em Johanesburgo, foi detectado um vírus novo, que provoca a destruição dos vasos sanguíneos e hemorragia. Três pessoas foram contaminadas. Mas só teve essa aparição. Vírus novos desse tipo podem surgir, mas pandemia não. Logo que o paciente é isolado, você contém facilmente a progressão.

Uma nova Aids é possível?

Ujvari: Há vírus parentes do HIV que o homem começa a descobrir nos macacos. O HTLV3 e o HTLV4 foram descobertos recentemente. Como o vírus da Aids nasceu desta maneira, é possível. Mas dificilmente seria uma epidemia parecida.
(O Globo)
Fonte:http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=76625

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