Redação do Site Inovação Tecnológica - 03/09/2012
Os átomos artificiais têm jeitos todo especiais de lidar com as ondas, e não apenas as ondas eletromagnéticas.[Imagem: Yushin Kim/KAIST]
Do barro aos metamateriais
Desde o início da civilização o homem tem transformado os materiais que encontra na natureza em materiais mais adequados às suas necessidades.
Com nem tudo pode ser assado ou grelhado em uma fogueira, ele criou panelas de barro e outros artefatos de cerâmica para facilitar sua vida. E, se folhas e galhos não são muito duráveis, e cortar pedras é muito trabalhoso, ele criou tijolos e telhas para construir suas casas.
São todos materiais artificiais, metamorfoseados pela mão do homem, mas o prefixo meta só foi agregado muito recentemente, quando os nascentes metamateriais começaram a se traduzir não apenas em alterações mecânicas, mas em alterações das propriedades eletromagnéticas em relação aos materiais naturais.
Nessa busca por novas funcionalidades, logo pareceu que os elementos químicos da Tabela Periódica não eram mais suficientes.
O homem começou então a construir meta-átomos e reuni-los em metamoléculas, para fazer metamateriais que desempenhem funções que nenhum material natural consegue.
Inicialmente com os mantos da invisibilidade, os metamateriais logo se mostraram capazes de alterar não apenas as ondas eletromagnéticas - a luz e o magnetismo -, mas qualquer tipo de onda - ondas sonoras, ondas do mar e até ondas sísmicas.
Esses materiais artificiais são tão promissores que já representam um campo de pesquisa verdadeiramente fervilhante, algo que pode ser ilustrado por uma amostragem dos feitos na área ocorridos apenas nas últimas semanas.
O controle que o metamaterial faz sobre as ondas eletromagnéticas é controlado variando-se a intensidade do brilho dos LEDs. [Imagem: Shadrivov et al./PRL]
Metamaterial controlado pela luz
Apesar das maravilhas obtidas com os metamateriais, impensáveis há alguns anos, a manipulação das ondas que esses materiais são capazes de fazer é uma característica intrínseca de cada um deles, de acordo com seu projeto.
Assim, eles funcionam continuamente, faltando-lhes uma espécie de chave liga/desliga.
Não falta mais.
Ilya Shadrivov, da Universidade Nacional Australiana, criou um metamaterial cujo efeito sobre as ondas eletromagnéticas é controlado por uma outra onda eletromagnética externa - um feixe simples de luz emitida por um LED.
Para demonstrar seu novo conceito, a equipe australiana criou um metamaterial que manipula a luz como se fosse um espelho plano normal.
Mas, controlado por um feixe de luz externo, ele passa a atuar como um espelho côncavo ou como um espelho convexo, sem qualquer alteração em seu formato.
O meta-átomo desse metamaterial controlado por luz é um ressonador em anel(SRR: split-ring resonator), um pequeno anel que não se fecha totalmente, em conjunto com um varactor, um componente eletrônico com capacitância variável, também conhecido como varicap.
Alterações nos varactores induzem uma mudança na ressonância do SRR, alterando a forma como ele interage com a luz, ou com a radiação eletromagnética em geral - que pode ser um feixe de micro-ondas, por exemplo.
A equipe conectou cada varactor a um fotodiodo, de modo que cada átomo artificial pode ser controlado por um LED instalado ao seu lado.
Assim, o controle que o metamaterial faz sobre as ondas eletromagnéticas pode ser por sua vez controlado variando a intensidade do brilho dos LEDs.
Meta-átomos (em destaque embaixo) e metamoléculas são bem diferentes de seus equivalentes naturais. [Imagem: Xiang Zhang et. al/Nature Communications]
Dos meta-átomos para as metamoléculas
Xiang Zhang, do Laboratório Berkeley, nos Estados Unidos, deu um passo adiante na "química" dos metamateriais.
Além disso, seu metamaterial também é controlado pela luz.
A equipe multi-institucional criou não meta-átomos, mas metamoléculas, cujo comportamento encontra uma similaridade na chamada quiralidade das moléculas naturais - a orientação para a direita ou para a esquerda de cada molécula.
O grande avanço é que as metamoléculas podem ter sua quiralidade alterada rapidamente de uma versão "destra" para uma conformação "canhota" usando apenas um disparo de luz.
As versões destras e canhotas das moléculas - os chamados enantiômeros - podem apresentar propriedades radicalmente diferentes.
"Os materiais naturais podem ser induzidos a mudar sua quiralidade, mas o processo, que envolve mudanças estruturais no material, é fraco e lento. Com nossas moléculas artificiais, nós demonstramos um chaveamento da quiralidade forte, dinâmico e em alta velocidade," disse Zhang.
As metamoléculas emitem feixes de radiação terahertz. Quando elas são energizadas por um feixe de luz, elas invertem sua quiralidade, alterando a polarização das ondas que emitem, um processo que pode ser feito e revertido à vontade.
As metamoléculas são formadas por um par de meta-átomos 3D, feitos de fitas de ouro, ambos com quiralidades opostas, o que preserva a quiralidade espelho.
As "ligações químicas" dessa meta-molécula são feitas através de pastilhas de silício, introduzidas em pontos diferentes de cada meta-átomo, quebrando o espelhamento.
As pastilhas de silício funcionam como chaves optoeletrônicas, que invertem a quiralidade da metamolécula quando recebem um feixe de luz.
Os pesquisadores afirmam que o princípio pode ser aplicado para reverter dinamicamente outras propriedades eletromagnéticas dos metamateriais.
Estas metamoléculas são formadas por dois tipos de meta-átomos, criando um material capaz de controlar ondas de magnetização. [Imagem: Miroshnichenko et al ACS.jpg]
Reações entre meta-átomos
Boris Lukyanchuk e seus colegas do Instituto AStar, de Cingapura, também trabalharam com metamoléculas.
Mas eles foram além, e formaram suas metamoléculas não apenas de um só tipo, mas de dois tipos diferentes de meta-átomos.
O primeiro "meta-elemento" é uma esfera de silício, colocada ao lado de um outro tipo de meta-átomo, o bem mais conhecido anel ressonante, feito de cobre.
Os pesquisadores estudaram a influência mútua desses dois meta-átomos sobre o componente magnético das ondas eletromagnéticas que devem ser manipuladas pelo metamaterial - uma propriedade conhecida como magnetização.
"Quando as duas estruturas estão separadas por mais de um micrômetro, ambas agem para reforçar o campo magnético local," explicou Lukyanchuk.
Quando elas são aproximadas, contudo, começam a interagir, o que resulta na diminuição da magnetização do ressonador em anel, a ponto de se tornar negativa para separações menores do que 0,5 micrômetro.
Esta é uma reprodução artificial de algo similar ao que acontece nos materiais naturais, quando um material se torna um ferromagneto, com todos os seus átomos contribuindo para sua magnetização "no mesmo sentido"; ao contrário, quando regiões do material têm magnetização oposta, ele se torna um antiferromagneto.
"Nós demonstramos que nossas redes híbridas de metamoléculas apresentam uma interação magnética dependente da distância, abrindo novos caminhos para a manipulação artificial do antiferromagnetismo, em materiais com baixa perda," disse o pesquisador.
Os metamateriais quânticos representam a última fronteira nesse campo emergente de pesquisas. [Imagem: Felbacq/Antezza]
Metamateriais quânticos
Os metamateriais também podem ser quânticos, conforme demonstraram Didier Felbacq e Mauro Antezza, da Universidade de Montpellier, na França.
Não satisfeitos com índices negativos de refração, mantos da invisibilidade,superlentes e mesmo com aplasmônica, eles demonstraram que é possível dar aos metamateriais um grau de liberdade quântica.
Diferentemente de um material artificial com propriedades quânticas, demonstrado há cerca de um ano, os dois pesquisadores propuseram duas técnicas para criar um metamaterial com propriedades quânticas.
A primeira usa como meta-átomos cristais artificiais de átomos comuns, ultrafrios, organizados de forma periódica por armadilhas ópticas, essencialmente criando umisolador de Mott.
Embora não haja empecilhos para sua construção, o aparato é um tanto complexo, exigindo condições precisas de laboratório, o que abre poucas possibilidades de uso prático.
A segunda técnica é bem mais promissora, usando meta-átomos de nanofios contendo pontos quânticos.
"Esta estrutura é interessante por várias razões: ela é simples, tem muitas propriedades interessantes (índice negativo, magnetismo efetivo, camuflagem totalmente dielétrica) e pode ser realizada experimentalmente de forma muito fácil," afirmam os pesquisadores.
Esta área das pesquisas é ainda muito recente, o que torna difícil prever suas implicações práticas sobre o campo dos metamateriais.
Contudo, como os fenômenos quânticos da matéria natural permitiram todo o desenvolvimento da eletrônica, é possível ter nos metamateriais quânticos um vislumbre das amplas possibilidades de uso da "matéria artificial" que os cientistas estão criando.
Bibliografia:
Metamaterials Controlled with Light
Ilya V. Shadrivov, Polina V. Kapitanova, Stanislav I. Maslovski, Yuri S. Kivshar
Physical Review Letters
Vol.: 109, 083902
DOI: 10.1103/PhysRevLett.109.083902
Photoinduced handedness switching in terahertz chiral metamolecules
Shuang Zhang, Jiangfeng Zhou, Yong-Shik Park, Junsuk Rho, Ranjan Singh, Sunghyun Nam, Abul K. Azad, Hou-Tong Chen, Xiaobo Yin, Antoinette J. Taylor, Xiang Zhang
Nature Communications
Vol.: 3, 942
DOI: 10.1038/ncomms1908
Optically induced interaction of magnetic moments in hybrid metamaterials.
A. E. Miroshnichenko, B. Lukyanchuk, S. A. Maier, Y. S. Kivshar
ACS Nano
Vol.: 6, 837-842
DOI: 10.1021/nn204348j
Quantum metamaterials: a brave new world
Mauro Antezza, Didier Felbacq
SPIE
DOI: 10.1117/2.1201206.004296
Metamaterials Controlled with Light
Ilya V. Shadrivov, Polina V. Kapitanova, Stanislav I. Maslovski, Yuri S. Kivshar
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Photoinduced handedness switching in terahertz chiral metamolecules
Shuang Zhang, Jiangfeng Zhou, Yong-Shik Park, Junsuk Rho, Ranjan Singh, Sunghyun Nam, Abul K. Azad, Hou-Tong Chen, Xiaobo Yin, Antoinette J. Taylor, Xiang Zhang
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Optically induced interaction of magnetic moments in hybrid metamaterials.
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Quantum metamaterials: a brave new world
Mauro Antezza, Didier Felbacq
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DOI: 10.1117/2.1201206.004296
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