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terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Emergentes dão basta à era das cópias

Criação ganha destaque nos países em desenvolvimento

A marca Pulpy foi lançada na China pela Minute Maid e depois levada para outros países da Ásia e América Latina. A marca Pulpy pode ser desconhecida em Londres, Nova York ou Tóquio. Mas a bebida à base de frutas mais vendida da Coca-Cola é a última moda em Xangai, Jacarta e Cidade do México.

Lançada na China pela Minute Maid, uma unidade da empresa americana, e depois levada a outros países da Ásia e América Latina, a marca agora se prepara para estrear no Leste Europeu e em outras regiões.

A Pulpy é o primeiro produto internacional da Coca-Cola a ser desenvolvido no mundo emergente e contribuir de forma significativa para as vendas mundiais do grupo, embora não se revelem valores. "É uma das inovações mais bem-sucedidas da Coca-Cola no século XXI", afirma Joanna Lu, diretora de marketing da Coca-Cola.

O sucesso da bebida coloca em evidência a importância cada vez maior da inovação nos países emergentes. China, Índia, Brasil e outros países não proporcionam às empresas apenas perspectivas de alto crescimento, mas também oportunidades para desenvolver novos produtos, serviços, técnicas de produção e processos administrativos.

Essas inovações não envolvem ainda mudanças tecnológicas transformacionais - tais invenções continuam sob o domínio do mundo desenvolvido com suas tradicionais universidades e laboratórios comerciais. O mundo emergente, no entanto, está criando aperfeiçoamentos de produtos com implicações comerciais suficientes para mudar inteiramente o cenário do jogo. Não ganham prêmios Nobel, mas geram dinheiro.

As multinacionais que minimizam a importância dessas inovações, atribuindo-as às circunstâncias locais, o fazem por conta e risco. As vantagens que os concorrentes ganham nos países emergentes também acabam sendo transferidas ao mundo rico.

"O perigo para muitas [multinacionais] é que não vejam as inovações nos mercados emergentes chegando, porque elas não estão chegando direto a seus mercados domésticos. Mas elas chegarão", afirma Christoph Nettesheim, da empresa de consultoria em administração Boston Consulting Group.

Há precedente: nos anos 1970, os produtos de grupos japoneses que avançavam nos mercados mundiais eram muitas vezes menosprezados como imitações de baixa qualidade e custo. Posteriormente, foi preciso admitir que eram inovadores, especialmente na miniaturização e nas técnicas administrativas de redução nos prazos de produção. Embora as próprias empresas japonesas estejam agora sob pressão de grupos ocidentais revigorados e de novos rivais do leste da Ásia, suas inovações são imitadas por todos os lugares.

A inovação nos mercados emergentes não é algo novo. Há mais de 20 anos, a Hindustan Lever, afiliada indiana de bens de consumo da anglo-holandesa Unilever, foi pioneira nos minissachês, como forma de levar seus sabonetes para os consumidores mais pobres. A novidade é o volume cada vez maior de tais inovações, a velocidade com que capturam mercados e o crescente papel em inovações das empresas locais, especialmente das chinesas, indianas, brasileiras e sul-africanas.

Certamente, as economias emergentes produzem aos montes produtos de má qualidade e várias cópias roubadas de originais japoneses e ocidentais. Mas meras imitações não sustentam uma empresa por muito tempo, tendo em vista a feroz concorrência nas grandes economias, principalmente na China. "Eles não precisam mais roubar. Isso é passado", como diz o vice-presidente da Nokia, Dieter May.

Com a China superando o Japão como 2ª maior economia do mundo, suas empresas encabeçam o ataque. A Huawei, líder em tecnologia de conexões, concorre frontalmente com a Ericsson, da Europa, até na Europa. A Mindray, fabricante de equipamentos médicos, desenvolveu monitores que custam 10% dos produtos rivais ocidentais. A Haier, empresa de produtos da linha branca, fabrica minigeladeiras de baixo custo.

Em outros países, a Tata Motors, da Índia, determina novos padrões de carros de baixo custo com o Nano, de US$ 2,5 mil. O laboratório farmacêutico Ranbaxydesenvolveu um remédio contra a malária a partir do zero. A SAB Miller, cervejaria sul-africana, desenvolveu uma cerveja de baixo custo com base no sorgo, uma colheita local que substitui o malte importado, mais caro.

No Brasil, a Embraer fabrica aviões comerciais de menor porte de classe mundial. Mesmo na Rússia, onde as condições de negócios são particularmente duras, também há inovações comerciais. A empresa de software Kaspersky Laboratories exporta programas de segurança de qualidade mundial, com sua própria marca.

Na área de serviços, a Bharti Airteltornou-se a maior operadora de telefonia móvel da Índia ao terceirizar quase tudo, desde a rede de transmissão até o sistema de contas. O médico Devi Shetty desenvolveu um sistema para fazer cirurgias cardíacas em massa em seu hospital, em Bangalore, com mil leitos.

Algumas empresas transformaram setores mundiais inteiros. Na área de terceirização, grupos indianos, encabeçados pela TCSe Infosys, revolucionaram a gestão da informação ao separar o trabalho feito por consultores in loco, de alto custo, do que é realizado fora do país, mais barato. "Mudamos o setor", diz Kris Gopalakrishnan, executivo-chefe da Infosys.

Países emergentes ainda têm muito pela frente até alcançarem as economias desenvolvidas em termos de ciência. Apenas a Rússia tem um número significativo de vencedores de prêmios Nobel científicos. A China, no entanto, está na dianteira mundial em formar engenheiros e cientistas - 2 milhões por ano, cinco vezes mais do que nos EUA, segundo a Research-Works, empresa asiática da área de investimentos.

Muitos dos melhores talentos partem do país, com cerca de 30% dos doutorados em ciência e engenharia nos EUA tendo nascido na China. "Nossas instituições de educação são fracas", afirma Win Yinga, chefe do China Capital Group, um fundo chinês de capital de risco. "Eles são criados para o aprendizado baseado na memorização, e não para criar formados voltados à inovação."

Mas há progressos. Acadêmicos chineses formados no ocidente estão voltando ao seu país em números cada vez maiores. A China produz mais estudos científicos, revisados por especialistas, do que qualquer outro país, com exceção dos EUA.

A superioridade científica não se traduz necessariamente em sucesso econômico, como mostram as dificuldades da Rússia para diversificar-se além das commodities. A inovação comercial é mais importante, como evidencia a ascensão da China.

Os investimentos chineses em pesquisa e desenvolvimento, em dólar, já superaram os do Japão e encaminham-se a passar os da União Europeia e igualar os dos EUA nos próximos 20 anos. Como os custos trabalhistas com a pesquisa e desenvolvimento ficam entre 20% e 50% dos verificados no ocidente, os números acabam superando os dos EUA, União Europeia ou Japão.

As principais empresas começam a ter resultados. Em 2008, a Huawei registrou mais patentes do que qualquer outra empresa, segundo o escritório de patentes mundiais, Wipo. No ano passado, havia ficado em segundo, atrás da Panasonic, do Japão. Ainda há, porém, um longo caminho pela frente: a única outra chinesa entre as cem primeiras foi a ZTE, outra fabricante de bens eletrônicos.

As multinacionais ocidentais reclamam que as empresas chinesas roubam tecnologia em sua investida de modernização, financiada pelo governo. Muitos projetos, no entanto, foram cedidos voluntariamente, em acordos de cooperação: as multinacionais apostam que os riscos valem a pena para entrar na China. Agora, as empresas chinesas estão entrando nos mercados mundiais, algumas vezes em parceria com rivais ocidentais. Um exemplo é a área de trens de alta velocidade, em que a CSR, da China, trabalha com a General Electric (GE), dos EUA, e a Siemens, da Alemanha.

Os céticos consideram muitas das inovações de países emergentes como apenas pequenos aperfeiçoamentos incrementados ao que já existe. Para as empresas, contudo, isso é irrelevante, se tais aperfeiçoamentos de fato levarem a melhores serviços, processos e produtos. "As inovações podem ser incrementais. Os efeitos não", diz Peter Williamson, professor de gestão internacional, na universidade de Cambridge.

As principais multinacionais concordam. Engenheiros da afiliada indiana da Siemens desenvolveram uma câmera de raios-X de baixo custo e boa qualidade, que será usada em equipamentos de países desenvolvidos.

"Uma boa ideia ou produto da Índia, por exemplo, pode ser conectado a um sistema global de vendas e produção", diz o executivo-chefe da Siemens, Peter Löscher. "Ajuda a aumentar a competitividade não apenas dos mercados emergentes, mas também dos países industrializados."

Várias multinacionais fazem o mesmo. A GE vende aparelhos de eletrocardiograma desenvolvidos na Índia e scanners de ultrassonografia projetados na China por todo o mundo. A Nokia usa software indiano e chinês para desenvolver smartphones. A Vodafonelançou um sistema sem fio de transferência de dinheiro chamado M-Pesa, na Safaricom, sua afiliada queniana. Esquemas similares voltados às pessoas sem contas bancárias foram lançados na África e, agora, na Índia.

As multinacionais também estão ampliando a pesquisa e desenvolvimento no mundo emergente, especialmente na China e Índia. A Siemens tem 12% de seus 30 mil funcionários de pesquisa e desenvolvimento na Ásia. Há cinco anos, eram 7%. A Microsoft encabeça uma lista de cerca de cem grandes empresas com centros de pesquisa e desenvolvimento na China. A GE é umas das mais de 50 multinacionais com centros na Índia.

"Em outros tempos, as soluções administrativas fluíam do ocidente para o oriente", diz o Navi Radjou, especialista em administração da universidade de Cambridge. "Agora, da mesma forma, fluem do oriente para o ocidente."

As empresas não buscam simplesmente disseminação geográfica - ou satisfazer pressões políticas para localizar seus centros de pesquisa e desenvolvimento. Querem as ideias geradas por pessoas trabalhando em condições econômicas e culturais diferentes. Ideias para cortar custos são fundamentais.

Muitas multinacionais antigamente almejavam apenas os segmentos de maior renda nos países emergentes. Agora, voltaram-se aos grupos de renda média, que crescem rapidamente. "Precisamos empurrar os produtos pirâmide abaixo", diz Abbas Hussain, chefe de mercados emergentes do laboratório farmacêutico britânico GSK.

Apenas reduzir custos, contudo, não é suficiente. Os consumidores nos mercados emergentes também querem qualidade, conveniência e elegância, afirma Jean-Philippe Salar, chefe de design da Renault. "Os indianos querem carros com visual dinâmico. O visual é muito importante."

Além disso, com os consumidores no mundo desenvolvido deparando-se com tempos de austeridade, eles também querem alternativas baratas. "A Índia é o lugar perfeito para projetar novos carros. Novos veículos precisam ser econômicos, pequenos e leves em comparação aos de dez anos atrás", diz Salar.

Radjou sugere que o sistema bancário por telefone celular - desenvolvido pela Safaricom - possa estendido aos países desenvolvidos. Mesmo nos EUA, cerca de 17 milhões de adultos não têm conta bancária. Alguns governos ocidentais estudam os tratamentos hospitalares de baixo custo lançados na Índia. Outros compram equipamentos médicos mais baratos , como os scanners de ultrassonografia desenvolvidos pela GE na China.

Lançar inovações mundiais não é nada fácil. Executivos de países desenvolvidos frequentemente subestimam seus colegas em mercados emergentes. As linhas de comunicação se rompem quando se alongam em divisões culturais.

Mas as empresas têm poucas opções a não ser inovar nas economias emergentes, porque é lá que estão os clientes. Como Mark Foster, da empresa de consultoria Accenture diz, "a inovação não surge em caixas, surg e em mercados".
(Stefan Wagstyl, do Financial Times)
(Tradução de Sabino Ahumada)

Brasil torna-se referência em odontologia

Uma das muitas coisas surpreendentes sobre o Brasil é que a odontologia praticada no país é uma das mais avançadas do mundo. A habilidade de seus dentistas e o tamanho de seu mercado, que cresceu rapidamente nos últimos anos, vêm atraindo algumas das maiores companhias de materiais odontológicos, como a Dentsplye, a Ultradent, dos Estados Unidos, e a KaVo, da Alemanha.

"É um ambiente que encoraja as pesquisas originais", afirma Luiz Abreu, diretor-geral da Ultradent para o Brasil e a América do Sul, que chegou ao Brasil em setembro de 2007.

Durante sua curta presença no país, a Ultradent já desenvolveu dois produtos para a venda no mundo todo. Um deles, a ser lançado em breve, é um instrumento chamado "apex locator" (delimitador de ápice), que ajuda na avaliação do trabalho necessário no tratamento de canal. O outro, batizado de Tilos, é um conjunto de limas para o tratamento de canal, projetado para ser menor intrusivo.

Abreu diz que a empresa tem "pelo menos" mais quatro produtos e técnicas em desenvolvimento no Brasil. Além disso, professores brasileiros de ortodontia são membros permanentes da equipe internacional de avaliadores da Ultradent, envolvida no desenvolvimento de novos produtos.

"O Brasil sempre despertou nossa atenção porque é o terceiro ou quarto país do mundo em termos do número de artigos publicados em periódicos de odontologia", diz. Mas desde que chegamos (...) nos aproximamos mais dessa realidade e vimos que o Brasil realmente contribui com novas técnicas, especialmente na combinação de materiais mais sofisticados com técnicas menos invasivas."

Abreu diz que a odontologia brasileira é uma combinação de culturas dos Estados Unidos, que enfatizam a estética, e da Europa, onde "o foco número um é que os dentes devem cumprir as funções que a natureza criou para eles".

O Brasil desenvolveu essa cultura híbrida por causa da desigualdade de renda. Uma minoria da população pode arcar com - e exige - os tratamentos mais sofisticados. Uma maioria muito mais numerosa precisa aceitar os serviços possibilitados por orçamentos muito mais limitados.

"Os dentistas enfrentam uma realidade brutal todos os dias", afirma. "É incomum um dentista ter apenas um consultório. Normalmente, eles trabalham com uma variedade de pacientes. Isso os faz manter a mente aberta."

Há uma tradição dos serviços públicos na odontologia. A cidade de Campinas foi a primeira no Brasil a adicionar flúor na água potável distribuída à população, depois que um dentista foi eleito para a Câmara Municipal. Hoje, quase toda a água encanada distribuída no Brasil recebe flúor.

Mas nem todas as condições são ideais para a inovação no Brasil. Tão notória quanto a desigualdade social é a burocracia humilhante do país. A linha Tilos, da Ultradent, desenvolvida por brasileiros, já está à venda nos EUA, Europa e Japão, mas não no Brasil. "Podemos desenvolver novos produtos, mas o processo de registro é m dos mais complicados do mundo", afirma Abreu.
(Jonathan Wheatley, do Financial Times)
(Tradução de Mário Zamarian)
(Valor Econômico, 10/1)
Fonte:http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=75778

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